O que o cliente encontra na sua loja: produtos ou propósito?

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Alessandra Morita - alessandra.morita@savarejo.com.br -

Mais do que mercadorias, uma nova geração de consumidores leva para casa diversidade, ética, preservação ambiental e cuidado com os funcionários. Entenda por quê

Olhe para os produtos que estão expostos nas gôndolas do seu supermercado. Leite, óleo, arroz, feijão, shampoo, sabonete, detergente líquido, sabão em pó. É isso o que você vê, mas não é o que uma parcela crescente dos consumidores enxerga. Para eles, você está vendendo atitudes éticas, inclusão social, cuidado com a sua gente, desenvolvimento econômico, bem-estar animal, preservação do meio ambiente. Esse grupo de consumidores transfere para as lojas e para as marcas vendidas por elas as causas que defendem e em que acreditam. E assim como acelerou a entrada no mundo digital, a pandemia está colocando um foco maior em aspectos humanos e levando os consumidores a pesar as atitudes das empresas em prol da sociedade em suas escolhas de compra.

 

ALIMENTAÇÃO SUSTENTÁVEL
O movimento Act for Food , do Carrefour, conscientiza e educa o consumidor sobre a importância de uma
oa alimentação, de evitar desperdício e de conhecer a origem dos produtos

“As pessoas têm expectativa de que as marcas do varejo e da indústria se posicionem e ajam com uma perspectiva social maior”, afirmou Débora Emm, curadora de conhecimento e sócia da Inesplorato , durante o SA Varejo Webinar Series #11 , que aconteceu em junho último.

“As marcas que não souberem ser parceiras vão perder seus consumidores no longo prazo. E aquelas que souberem ser vão ganhar clientes daqui para a frente. O que se está construindo hoje é um vínculo emocional forte com as marcas que estão se colocando como parte da sociedade”, analisou a especialista.

Esse comportamento ainda tem nas novas gerações seus principais representantes, mas é importante lembrar que elas influenciam – e muito – as atitudes da família. Paulo Ferezin, líder para o segmento de varejo da KPMG no Brasil, lembra ainda que as pessoas com 20 a 30 anos terão, em 2025, idade de 25 a 35 e, portanto, já responderão por uma parcela importante da cadeia de consumo. Segundo ele, estamos em um processo de transformação que não acontece do dia para a noite, mas de forma constante. O que significa que uma mudança de atitude das marcas – de supermercados ou fornecedores – poderá deixá-las mais bem posicionadas para esse futuro próximo.

 

"O CONSUMIDOR NÃO LIGA PARA AS ATITUDES DAS EMPRESAS"
NÃO É BEM ASSIM

Basta fazer uma busca na internet ou relembrar as notícias de algum tempo atrás para entender como as pessoas estão dando voz àquilo que veem como problema na sociedade. Dois exemplos muito claros foram os movimentos “Vidas negras importam”, desencadeado nos EUA, e as inúmeras manifestações pelo mundo afora em relação ao desmatamento da Amazônia. E não há dúvidas de que tudo isso pressiona as empresas a se posicionar.

A busca pelo termo ESG, que diz respeito a iniciativas ambientais, sociais e de governança, cresceu 400% nos últimos nove meses, conforme dados do Google Trends.

EMPRESAS E MARCAS DEIXAM A DESEJAR

80% dos brasileiros acreditam que o número de marcas com consciência social não é suficiente

37% verificam se a marca comprada desenvolve ações sociais e ambientais

40% avaliam se os produtos são livres de crueldade contra os animais

Fonte: pesquisa da Thankyou com 500 consumidores

MAIS NOVOS INFLUENCIAM FAMÍLIAS

48% das pessoas no Brasil adquirem consciência ambiental por meio dos filhos. A média global é de 50%

57% dos consumidores dizem que empresas em geral, indústrias e varejistas devem contribuir para solucionar problemas sociais*

73% dos millennials afirmam que pagariam mais por produtos ou soluções sustentáveis

Fontes: (dado 1) pesquisa Who Cares, Who Does? – Kantar / (2) Mosaiclab – pesquisa com 5.023 pessoas em todo o mundo / (3) GPA/Nielsen . * % sobre total de respondentes

 

"MINHA LOJA NÃO SERÁ AFETADA"
NÃO ACREDITE NISSO

A varejista britânica Tesco recentemente foi pressionada pelo Greenpeace a deixar de comprar carne da Moy Park e da Tulip, controladas pela JBS . A empresa, entretanto, entendeu que os fornecedores seguem os padrões ambientais e de desmatamento zero estabelecidos. Em sua participação no 21º Webinar de SA Varejo , realizado em outubro, Gilberto Tomazoni, CEO Global da JBS, comentou que não importa o fato de a Moy Park só ter operações na Inglaterra. Ela é parte da JBS e o que se faz aqui impacta também por lá. “O mundo hoje está conectado. Por isso temos de assumir nosso papel social de agente transformador da sociedade”, afirmou o executivo (veja entrevista na sequência desta reportagem). A JBS lançou em setembro um programa voltado à preservação do bioma Amazônia e ao desenvolvimento das comunidades locais. “Estou convicto de que podemos fazer muito. A experiência com as nossas doações para o combate à Covid-19 mostrou que o envolvimento de todos dá uma tremenda energia interna”, disse na live.

Outro exemplo, também vindo da Europa: em setembro último, uma coalizão de grupos indígenas e ambientalistas divulgou um documento pressionando o Casino , grupo francês que controla o GPA , a interromper a compra de carne bovina proveniente de áreas identificadas como de grilagem de territórios indígenas ou de desmatamento. À SA Varejo, Susy Yoshimura, diretora de sustentabilidade, explicou que o GPA tem como compromisso a construção de modelos de negócios mais sustentáveis e que apoia sua rede de abastecimento na conscientização e no estabelecimento de critérios socioambientais para fornecimento à companhia, ao mesmo tempo que incentiva inovações e boas práticas de impacto positivo.

Além disso, desde 2016, o Grupo conta com uma política de compra de carne bovina que homologa os fornecedores nacionais de todos os seus negócios, com o objetivo de identificar a origem direta e garantir o cumprimento de critérios socioambientais na produção de carne in natura, resfriada e congelada. “Cientes dos desafios e riscos, bem como da complexidade dessas cadeias, continuamos reforçando nossas ações e políticas, em conjunto com todas as partes interessadas em um processo construtivo. Dentro desse processo de construção conjunta, o GPA nunca recebeu questionamentos de entidades ou representantes de povos indígenas. Reiteramos, inclusive, que estamos totalmente abertos ao diálogo constante com nossos stakeholders”, ressalta Susy.

SUSTENTABILIDADE HUMANA GANHA FORÇA
Segundo pesquisa da Mosaiclab, com 5.023 participantes de 17 países, incluindo o Brasil, esses problemas se agravarão:

88% das pessoas acreditam que teremos preconceitos sociais latentes nos próximos 5 a 10 anos

ORIGEM IDENTIFICADA
O GPA tem um programa que garante dos fornecedores de carne
cumprimento de critérios socioambientais

"AQUI É DIFERENTE DA EUROPA!"
SIM. MAS POR ENQUANTO

É verdade que o Brasil, em função da desigualdade, ainda é um País com necessidades muito básicas de consumo. Basta olhar o que aconteceu com o acesso a produtos e serviços a partir do auxílio emergencial de R$ 600 oferecido pelo governo nesta pandemia. Mas há um fator determinante para uma maior conscientização dos consumidores quanto às questões sociais e ambientais. “O aspecto da comunicação mudou muito e não foi apenas nos grandes centros”, diz Lúcio Vicente, head de sustentabilidade do Carrefour Brasil.

“As redes sociais deram muito mais velocidade à propagação das informações. Qualquer assunto relacionado a questões ambientais é disseminado com uma grande agilidade e tem embarques rápidos dos consumidores, estejam em São Paulo ou em Manaus”, avalia. “Hoje, se perguntarmos sobre aquecimento global para alguma pessoa, ela certamente vai ter uma opinião, pois já ouviu falar no assunto. Nem que seja o fato de não acreditar em sua existência”, argumenta o executivo.

Também pesa para mudanças nas atitudes dos consumidores as iniciativas das próprias empresas voltadas a educar o público sobre os temas sociais e ambientais. O Carrefour é um exemplo. Tem na educação um dos pilares do seu movimento Act for Food, que visa contribuir para uma transição alimentar da população. Nas lojas, os clientes encontram, por exemplo, informações específicas sobre os produtos. Por meio de QR Codes, a linha Sabor & Qualidade permite que os clientes conheçam a origem de hortifrútis e, no segmento de carne suína, tudo sobre os animais, desde o seu nascimento.

“A população espera que as empresas tenham um papel
relevante diante de problemas sociais, pois seu lucro vem do consumo
da coletividade e, por isso, anseia por um retorno para a sociedade”

Fonte: pesquisa da Mosaiclab com 5.023 participantes de 17 países , incluindo o Brasil

AMBIENTE X CONSUMO
No Carrefour, o cliente é incentivado a comprar diferentes tipos de peixes
para ajudar no equilíbrio entre as espécies

Há iniciativas educativas também no digital, como explicar o impacto de cada prato no meio ambiente. Por meio da plataforma CyberCook, o consumidor tem acesso a informações nutricionais e conhece a economia total e por porção gerada pelas receitas. Também aprende a evitar desperdícios e fica sabendo quais alimentos ajudam a equilibrar o ambiente. Isso é possível sugerindo alternativas de compra diferentes – por exemplo, oferecendo peixes menos conhecidos dos consumidores. “Além disso, publicamos o nosso relatório de sustentabilidade deste ano em uma versão em quadrinhos para incluir a criança nesse contexto”, acrescenta Vicente. Além da educação, os outros pilares do Act for Food são o incentivo ao consumo de alimentos saudáveis, o maior acesso a eles do ponto de vista econômico e a democratização da informação.

"AINDA ESTÁ LONGE DE TER UM IMPACTO REAL NAS LOJAS".
NÃO SE ENGANE: ISSO JÁ ACONTECE

Algumas mudanças já começam a ocorrer de maneira concreta nos super e hipermercados, ainda que de forma lenta e, muitas vezes, sem o varejista perceber. Um primeiro aspecto é que já existe um bom número de iniciativas sustentáveis na construção das lojas. O uso de placas fotovoltaicas, que convertem energia solar em elétrica, por exemplo, é cada vez mais comum. Mas a maior valorização de atitudes sociais e sustentáveis começa a se refletir também no sortimento. Para se ter uma ideia, a Marfrig lançou em agosto deste ano a marca Viva, uma linha de carnes com atributos de sustentabilidade, desenvolvida pela Embrapa. “Na produção desse produto, a emissão de gases de efeito estufa, provocada pela atividade pecuária, é neutralizada por meio de um sistema em que a pastagem é integrada ao plantio de árvores”, explica Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade e comunicação da companhia. “A carne carbono neutro é um conceito relativamente novo, que precisa ser divulgado não só para os consumidores, mas entre os varejistas, que levarão o produto até seus clientes”, diz o executivo da Marfrig.

O assunto começa a chegar também ao atendimento da indústria ao varejo. A P&G criou um programa para capacitar o time de vendas a ajudar os clientes a se desenvolver em sustentabilidade e cidadania. A iniciativa discutirá como focar essas causas sustenta o crescimento do negócio. Marjorie Teixeira, diretora de comunicação, lembra que, durante a pandemia, a companhia divulgou uma série de comunicados com recomendações ao varejo. Um deles abordou a questão das iniciativas sociais e teve uma repercussão positiva. Muitos varejistas levaram à P&G suas propostas de ações sociais em busca de apoio. “A intenção de ajudar e a preocupação com a sociedade já existem. Acredito que falte ao varejo colocar isso como uma estratégia de longo prazo para ter um impacto maior das iniciativas”, avalia a diretora de comunicação.

“Quando o consumidor está na loja física, é mais fácil ele optar por uma marca com base em uma
decisão econômica. Mas, no e-commerce, canal que cresceu muito com a pandemia, é diferente.
Como não há uma interação direta com o produto, a tendência é ele optar por marcas sobre as
quais já sabe alguma coisa, por exemplo, suas práticas de ESG”

Paulo Ferezin
Líder para o segmento de varejo da KPMG no Brasil

BOAS PRÁTICAS SOCIAIS E AMBIENTAIS: QUESTÕES ECONÔMICAS

Adotar atitudes que preservem o meio ambiente ou em prol da sociedade é uma necessidade econômica para a indústria e para o varejo. Para Ricardo Zibas, sócio da prática de ESG Advisory da KPMG no Brasil, a escassez de água, por exemplo, gera redução na oferta, o que leva a aumento de custo, que, certamente, impactará também o consumidor final. O mesmo raciocínio serve para outras situações. “O quanto um produto é realmente mais barato no ponto de venda se ele é produzido com mão de obra infantil? No final, toda a sociedade paga a conta”, afirma o especialista.

70% dos CEOs entendem que é sua responsabilidade pessoal garantir que as
políticas de ESG da empresa reflitam os valores dos seus clientes

Fonte: pesquisa KPMG

Já Eliete Martins, também sócia da prática de ESG Advisory da KPMG no Brasil, ressalta que as questões sociais, ambientais e de governança, cada vez mais, estão sendo incorporadas aos planos estratégicos das empresas, o que inclui também o varejo. Esse movimento se intensifica conforme mais fundos de investimento se posicionem em relação às companhias de capital aberto que não seguem boas práticas nessa área. “Notamos, inclusive, que essa pauta já é uma das maiores preocupações dos CEOs. Eles agora entendem que, por ocuparem o cargo mais alto nas empresas, precisam estar atentos a esses pontos”, comenta a especialista.

 

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