Walmart no Brasil: por que deu errado?

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Rafael Faustino -

Em 23 anos no País, filial da rede norte-americana nunca conseguiu os resultados esperados por aqui. Em junho deste ano, 80% do controle foi vendido à empresa de private equity Advent International

Desde que desembarcou no Brasil em 1995, com duas grandes lojas na Grande São Paulo, o Walmart teve momentos de otimismo, mas nunca de tranquilidade. Vinte e três anos e várias aquisições depois, a rede norte-americana jogou a toalha. 

No início de junho, o fundo de private equity Advent International  anunciou a compra de 80% da operação brasileira do Walmart. O valor do negócio não foi revelado, no entanto envolveu “alguns bilhões de reais” que serão integralmente investidos na operação brasileira, de acordo com declaração à imprensa de Patrice Etlin, sócio do fundo no Brasil. Foi o maior cheque já assinado em aquisições na América Latina pelo Advent, que acumula investimentos em mais de 30 empresas brasileiras, entre as quais a rede de restaurantes Viena e os grupos educacionais Kroton e Estácio. 

A negociação não surpreendeu o mercado, afinal meses antes do acordo já havia expectativa de que o Walmart Brasil fosse vendido a qualquer momento. O fraco desempenho da operação brasileira contribuiu para aumentar os rumores. É bem verdade que o varejo brasileiro, como um todo, não pode se gabar de resultados maravilhosos, em especial nos últimos anos de crise. Mas o Walmart apresentou números particularmente ruins: queda de faturamento nos últimos três anos até 2016. A receita dos supermercados da rede retraiu 18% de 2013 a 2016, período em que o faturamento por metro quadrado caiu 16% no faturamento por metro quadrado. O fechamento de 59 lojas e a redução de 12,7% no número de funcionários mostra uma tentativa, infrutífera, de estancar a sangria. Em 2017, o Walmart Brasil faturou R$ 28,1 bilhões, resultado que representou uma queda de 7,4% em relação a 2016, já descontada a inflação.

Mas onde estaria a raiz dos problemas? Consultados por SA Varejo, analistas de varejo apontam razões diferentes para o insucesso do Walmart no Brasil.

Aposta exagerada em preços baixos

“O Walmart sempre teve uma operação deficitária e mal gerida no Brasil. Faltou, principalmente, acompanhar o momento de mudança do varejo no início do século, em três aspectos: preço, mix e atendimento”, resume Roberto Nascimento, coordenador do Retail Lab da ESPM, que trabalhou por uma década na rede. 

Para ele, apostar na política de “Preço Baixo Todo Dia”, adaptada dos Estados Unidos, foi um dos principais erros. “Preço baixo não é o que o cliente quer no século 21. Ele deseja valor agregado com nível de serviço. Você precisa mostrar ao cliente que aquele produto vale mais do que o preço que ele está pagando. As empresas bem-sucedidas de hoje agregaram valor a seus serviços e apostaram no atendimento qualificado”, analisa Nascimento.

Escolha ruim dos formatos de loja

Para o especialista, o Walmart também demorou demais para perceber que os hipermercados estavam obsoletos. “Esse formato acabou, não é mais um modelo de sucesso. A loja de vizinhança, compacta, é hoje modelo mais bem-sucedido. E não ter apostado nela, somado aos outros fatores, fez com que houvesse o declínio”, explica Nascimento.

Letargia nas decisões

Professor dos MBAs da Fundação Getúlio Vargas, Roberto Kanter também credita aos formatos de lojas parte da explicação para os problemas do Walmart Brasil. E lembra de uma oportunidade específica que poderia ter feito a diferença, mas a rede deixou passar. “Hoje as lojas de grande rentabilidade são os atacarejos. Quando perdeu o leilão do Atacadão para o Carrefour, o Walmart ficou sem alternativa”, recorda. Em 2006, o Carrefour adquiriu a rede atacadista por R$ 2,2 bilhões, superando a concorrência de GPA , Walmart e Makro .

Expansão mal-planejada

Não foram, no entanto, apenas escolhas de gestão de loja que levaram o Walmart a uma situação cada vez mais difícil. Segundo Kanter, o projeto de expansão foi mal-planejado. “Eles fizeram o que era esperado: comprar redes regionais. Mas adquiriram bandeiras que não têm sinergia. O Walmart resolveu, então, fazer uma expansão orgânica na década passada, pior momento em termos de preços dos imóveis. Começaram a pagar valores crescentes de terrenos e aluguéis, em pontos ruins ou de oferta limitada de imóveis”, diz.

Mesmo a administração de bandeiras fortes regionalmente, como o Big, no Sul e o Bompreço, no Nordeste, registrou problemas ao longo dos anos. A demora para a integração dos sistemas de gestão – que até hoje não se sabe se está completa ou não – contribuiu igualmente para as crescentes dificuldades. “Eles não entenderam os mercados regionais, embora tenham feito movimentos interessantes de aquisição. O melhor teria sido estudar os mercados e transformar as lojas para Walmart, que é uma marca de respeito. Mas acabaram deixando sete, oito marcas, cada uma com seu DNA, mas nenhuma delas com escala nacional, o que virou uma colcha de retalhos”, critica Roberto Kanter. 

Dificuldades também no exterior

Não é só no Brasil que as coisas não vão muito bem para o Walmart. No balanço global da companhia, apesar do aumento na receita de US$ 485 bilhões para R$ 500 bilhões, houve uma queda no lucro líquido atribuível à empresa, de US$ 13,6 bilhões para US$ 9,8 bilhões. O retorno por ação da varejista também apresentou forte queda, de US$ 4,4 para US$ 3,2. Nos Estados Unidos, maior operação da rede, o mercado foi pego de surpresa com a decisão de fechar 63 lojas do Sam’s Club em janeiro deste ano, e as ações da empresa, que começaram o ano valendo US$ 100, agora estão na faixa dos US$ 83. “Infelizmente, a empresa, que já foi a maior do mundo, hoje vale muito menos do que valia anos atrás”, diz o ex-diretor, Roberto Nascimento.

Outras operações internacionais sofreram, recentemente, dificuldades semelhantes às do Brasil. A operação no Reino Unido foi vendida em abril deste ano, por US$ 10 bilhões, seguindo o que já havia acontecido em 2006 na Alemanha e na Coreia do Sul. Nesses casos, também foi reportada uma inadequação do modelo de negócio do Walmart às condições locais de mercado. Igualmente complicado para a companhia tem sido lidar com o atraso nos investimentos em e-commerce. Nesse segmento, a  Amazon deu uma rasteira rápida e sentida.

Novo comando deve apostar em atacarejo

Agora, nas mãos da Advent International, a política de “Preço Baixo Todo Dia”, que nunca engrenou no Brasil, deverá ser finalmente deixada de lado. A operação de atacarejo será bastante reforçada, inclusive com conversão de lojas de hipermercado em unidades da bandeira Maxxi Atacado. Supermercados de vizinhança da bandeira Todo Dia também devem receber investimentos, assim como o clube de compras Sam’s Club.   

Luiz Fazzio, com 36 anos de experiência em varejo, foi o escolhido pelos novos donos do Walmart Brasil para assumir a presidência da empresa. Quando comandou a operação brasileira do Carrefour, recolocou a empresa no caminho dos bons resultados ao impor rigorosa política de controle de custos e apostar com convicção no formato atacarejo. Uma das primeiras tarefas de Fazzio e sua equipe será definir quais das 12 bandeiras regionais adquiridas pelo Walmart no Brasil serão mantidas. A Advent pagará royalties à matriz do Walmart pela utilização das marcas globais da rede varejista.

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